Os nossos tupinambás muito se admiram dos franceses e outros estrangeiros se darem ao trabalho de ir buscar o seu arabutan (madeira pau-brasil). Uma vez um velho perguntou-me:
- Por que vindes vós outros, maírs e perôs (franceses e portugueses), buscar lenha de tão longe para vos aquecer ? Não tendes madeira em vossa terra ?
Respondi que tínhamos muita, mas não daquela qualidade, e que não a queimávamos, como ele supunha, mas dela extraímos tinta para tingir, tal qual o faziam eles com os seus cordões de algodão e suas plumas. Retrucou o velho imediatamente:
- E porventura precisais de muito ?- Sim, respondi-lhe, pois no nosso país existem negociantes que possuem mais panos, facas, tesouras, espelhos e outras mercadorias do que podeis imaginar e um só deles compra todo o pau-brasil com que muitos navios voltam carregados.
- Ah! retrucou o selvagem, tu me contas maravilhas; acrescentando depois de bem compreender o que eu lhe dissera: Mas esse homem tão rico de que me falas não morre?
- Sim, disse eu, morre como os outros.
- Sim, disse eu, morre como os outros.
Mas os selvagens são grandes discursadores e costumam ir em qualquer assunto até o fim, por isso perguntou-me de novo:
- E quando morrem para quem fica o que deixam ?- Para seus filhos, se os têm, respondi; na falta destes, para os irmãos ou parentes próximos.
- Na verdade, continuou o velho, que como vereis, não era nenhum tolo, agora vejo que vós outros maírs sois grandes loucos, pois atravessais o mar e sofreis grandes incômodos, como dizeis quando aqui chegais, e trabalhais tanto para amontoar riquezas para vossos filhos ou para aqueles que vos sobrevivem ! Não será a terra que vos nutriu suficiente para alimentá-los também ? Temos pais, mães e filhos a quem amamos; mas estamos certos de que depois de nossa morte a terra que nos nutriu também os nutrirá, por isso descansamos sem maiores cuidados.
(publicado no livro "Viagem à terra do Brasil" de Jean de Léry)
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